quarta-feira, 24 de outubro de 2012

pitacos da mostra 2012

Comentários brevíssimos dos filmes que vou assistido...
DE PAI PARA FILHO, de Paul Lacoste (França) : minúcias culinárias. Cinema para gastrônomos.
SUPER NADA, de Rubens Rewald (Brasil/México): pouco a dizer, apenas que o Jair Rodrigues não merecia isso.
SAUDAÇÕES DE TIM BUCKLEY, de Daniel Algrant (Estados Unidos): biografias intercaladas dos músicos Tim e Jeff Buckley, pai e filho. 90 agradáveis minutos.
O PESO DA CULPA, de Lars Gunnar Lotz (Alemanha): um chute no estômago (literal e metaforicamente). Pesado, e ainda assim, muito bom.
TEMPO DE CRISE, de Anika  Wangard (Alemanha): crise com leveza.
MOSQUITA E MARI, de Aurora Guerrero (Estados Unidos): duas meninas; duas línguas; duas confusões...
A RIQUEZA DO LOBO, de Damien Odoul (França): por falha técnica, sessão cancelada. Dizem-me que tive sorte.
DINOTASIA, de David Krentz (Estados Unidos): filminho da história da Terra na época dos Dinos. Soube que a locução era do Herzog. E isso me enganou.
ANTIVIRAL, de Brando Cronenberg (Canadá): doentio. Sim, o menino é filho de David Cronenberg, e precisa de cuidados.
INDIGNADOS, de Tony Gatlif (França): crise com peso. Um filme necessário.
ÁGUA, de Nir Sa'ar, Maya Sarfaty, Mohamed Fuad, Yona Rozenkier, Mohamed Bakri, Ahmad Bargouthi, Pini Tavger e Tal Haring (Palestina/Israel): sete curtas dirigido por nove diretores que tem a água, mais como um elemento político do que químico. Fragmentariamente bom.
A HORDA, de  Andrei Proshkin (Rússia): épico ambientado no mundo Mongol do século 14. Boa fotografia mas um fio sem meada.
111 GAROTAS, de Nahid Ghobadi e Bijan Zmanpira ( Iraque/Irã): 111 garotas curdas ameaçam se suicidar pela ausência de homens na comunidade e mandam carta para o presidente do Irã. Mistura de drama com humor na pitada exata e com excelente fotografia. Grande filme.
CANÇÃO PARA MEU PAI, de Amos Gitai (França/Suiça): filme com grife. Gitai faz homenagem e ao mesmo tempo uma busca de compreensão do pai, Munio Gitai Weinraub, ligado à Bauhaus, escola fechada por Hitler. Acesso difícil.
POST MORTEM, de Pablo Larrain (Chile, México, Alemanha): cortante. Uma autópsia da ditadura chilena.
ISTAMBUL, de Török Ferenc ( Turquia/Hungria/Holanda): Katalin faz uma viagem, física e psicológica, para um encontro com sigo mesma, longe da família. Belo filme.

sábado, 20 de outubro de 2012

a 36° mostra

Já são 36 anos da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. 36 anos de uma insistência pessoal de Leon Cakoff, morto em outubro do ano passado pouco antes da abertura na Mostra de 2011. (Contei uma história pessoal na postagem leon cakoff em15 de outubro de 2011).
A insistência de Cakoff, foi exercitada em função de inúmeros fatores, desde as ingerências de Pietro Maria Bardi, o diretor do Museu de Arte de São Paulo - Masp -, onde teve início a Mostra, passando pelas censuras e enfrentamento, muitas vezes,  a agentes da repressão na época da ditadura,  até as dificuldades financeiras. Toda essa história pode ser degustada no livro "Cinema Sem Fim" de Leon Cakoff, publicado pela Editora da Imprensa Oficial em que Cakoff contava a história das 30 primeiras edições da Mostra. Para os cinéfilos, participantes ou não da Mostra, é uma obra imperdível. De cabeceira.
A 36° Mostra começou para o público no dia 19, última sexta-feira. Filmes, programações e outras informações podem ser obtidas na página da mostra .

sábado, 6 de outubro de 2012

o risco que corremos


A história da América Latina é marcada por inúmeros golpes contra as instituições democráticas, ainda que estejamos falando de democracias incipientes. Passamos pelo século 20 sempre sujeitos aos humores dos quartéis, sempre prestes a colocarem munição nos seus aparatos bélicos e os apontarem contra a população.
Na passagem para o século 21 tivemos a sensação que golpes faziam parte da nossa história, superados por constantes e persistentes processos de construção da nossa democracia.
Entretanto, as tentativas de golpe na Guatemala em 2009 e Equador em 2010 e os golpes consolidados em Honduras e Paraguai que derrubaram os presidentes Manuel Zelaya e Fernando Lugo, respectivamente, nos apontam para uma outra abordagem: que a essência conceitual dos “golpes” permanece; o que muda são as formas. Os tanques de guerra em volta dos palácios presidenciais são imagens que prescreveram. Não cabem mais nas lentes midiáticas e globalizadas que cruzam o planeta em tempo real. A arquitetura do golpe evoluiu. Ele, hoje, deve ter um caráter “democrático”, respaldado pelo aparato institucional constituído e pautado e disseminado pelos setores oligopolizados das redes de comunicação que, na América Latina, continuam nas mãos hereditárias de poucas famílias.

Um exercício plausível de se fazer é que as duas tentativas frustradas no Equador e na Guatemala, e o golpe bem sucedido em Honduras, ainda que a trancos e barrancos, serviram de laboratório para o êxito do golpe no Paraguai.
O risco e a preocupação evidentes, é que se module nos bastidores dos poderes paralelos, uma disseminação no continente de um certo, e novo, modus operandi do golpe. A base para isso existe, e são as nossas democracias ainda não firmemente constituídas.


A mídia que temos



Em 2005 tínhamos, além das novelas da sete e das nove, a novela das oito, com o nome de “Mensalão”. Hoje temos a segunda edição da mesma novela, agora com cenário mais pomposo e, da mesma forma, com um roteiro composto pela espetacularização, mas com outros cuidados. A agenda do julgamento da Ação Penal 470, o Mensalão, foi tão milimetricamente calculada que, mais do que ter sido aberta paralelamente às eleições municipais, culminou com o julgamento de José Dirceu exatamente no momento de fechamento das campanhas pelo primeiro turno. Os relógios do STF, do TSE e do Jornal Nacional foram acertados conjuntamente. Em 1997, todos sabemos, houve compra de deputados para a aprovação da reeleição de FHC. Ao contrário da Ação Penal 470, há provas cabais do comércio, mas o STF não a julgou. “A compra de votos para a reeleição de FHC” não recebeu um nome de impacto publicitário da imprensa, como por exemplo “Mensalão” e acabou esquecida.
Mas há outras tantas coisas que a imprensa também esquece, ou prefere não revelar. É necessário que se faça pesquisas para saber que a Federal Communications Commission (FCC), órgão regulador da área de telecomunicações e radiodifusão dos Estados Unidos fechou entre 1937 e 1987, 141 concessionárias de rádio e TV e em 40 delas, nem esperou que acabassem o prazo da concessão. Nunca foi mencionado por aqui que a indefectível Margareth Thatcher também cancelou concessões, em alguns casos por tentativa de formação de monopólio. O mesmo fizeram, sem nenhum contratempo, a França, o Canadá, a Espanha entre outros tantos países de democracias consolidadas. Leis de concessões e suas aplicações para a área de comunicação, fazem parte de qualquer país democrático. Democracias consolidadas pressupõem processos de construção de instituições sólidas e de uma imprensa responsável e plural. Na adolescência em que vivemos, as famílias que comandam o conglomerado de comunicação no Brasil, se irritam quando alguém, inadvertidamente, ousa afirmar a necessidade da “democratização dos meios de comunicação” e encontram nas figuras de Hugo Chavez e Cristina Kirchner os demônios a serem combatidos, em nome da “liberdade de expressão”.
A tarefa urgente desta mídia de pensamento único, neste momento, é pautar o Superior Tribunal Federal, envolto com a Ação Penal 470.
O STF que temos

O tribunal máximo da nação tem se esmerado em dar uma resposta contundente e rápida – como dissemos, respeitando o calendário eleitoral - aos anseios da sociedade que a mídia, essa que temos, tem propagado. E para tanto, tem criado, sobretudo na figura do seu relator, novas formas de entendimento da análise de uma ação penal, que é a de criminalização por indícios e não por provas. O exercício de retórica da maioria dos seus membros produz um contorcionismo por vezes extravagante, perceptível até mesmo na apreciação dos leigos. Vale até recuperar peças não tão em voga no universo jurídico atual, como a que vimos, sobretudo nesta semana, que é a tal da “Teoria do Domínio de Fato”. Rastreando aqui e ali sobre o entendimento de inúmeros juristas, percebemos que, com ela, José Dirceu será condenado mesmo que, em tese, não tenha nenhuma ligação com os casos tratados no julgamento. Ele será declarado culpado, se não por outra razão confirmada, mas porque exercia cargo de chefia. O que já tínhamos de fato, é que a imprensa, essa que temos, já tinha dado o seu veredicto. O STF apenas o confirmará. Durante o processo, o Jornal Estado de São Paulo chegou até a antecipar o texto do voto de um determinado juiz, o que fere completamente a liturgia do cargo. O Procurador Geral, Roberto Gurgel, declarou que "será salutar se o julgamento do mensalão tiver impacto nas eleições".
Rasgadas as hipocrisias, o STF está julgando a Ação Penal 470 de modo político e não técnico.


O risco que temos
O risco que corremos está delineado. Temos, ao contrário do que foi amplamente propagado, uma democracia ainda frágil e sujeita a determinados jogos de interesses que serão tão mais expoentes quanto ainda frágil for a nossa democracia. Escaparmos desse risco implica em sairmos deste círculo, e para tanto, há ainda um caminho sinuoso a ser percorrido.
Essa nossa mídia de pensamento único pleiteia, com os componentes de um discurso fácil e palatável, a defesa da “liberdade de expressão”.  Ora, qualquer liberdade pressupõe um objeto que incorpore o significado do que é ser livre. Que acolha, intrinsecamente, a responsabilidade da sua aplicação.
Em outro artigo neste Empório, tratei de liberdade ligada à arte, e dizia que a liberdade tem um limite, que é aquela em que o artista define a obra: a última pincelada, o último acorde. Liberdade tem sempre os seus limites. Nas regras de sociabilidade, eu não sou livre para, limpando a minha casa, jogar a minha sujeira na casa do vizinho. A imprensa não pode se arvorar do vasto conceito de “liberdade de expressão” para macular, indiscriminadamente, a vida de alguém, por exemplo, e, tão pouco, pode escolher um oponente e tratá-lo como inimigo, desconsiderando os ditames mais elementares da ética jornalística. A presidente Dilma, fez uma interessante síntese do que estamos abordando. Disse ela: " A multiplicidade de pontos de vista, a abordagem investigativa e sem preconceitos dos grandes temas de interesse nacional constituem requisitos indispensáveis para o pleno usufruto da democracia, mesmo quando irritantes, mesmo quando nos afetam, mesmo quando nos atingem. E o amadurecimento da consciência cívica da nossa sociedade faz com que nós tenhamos a obrigação de conviver de forma civilizada com as diferenças de opinião, de crença e de propostas." Liberdade de expressão, portanto, é um dos elementos da democracia e não pode ser confundida com liberdade pleiteada pelos donos da comunicação de poder fazer, indiscriminadamente, as suas escolhas baseadas nos seus interesses mais particulares.
Mas essas escolhas estão cada vez menos envergonhadas e, com a novela "Mensalão" e seu aparente sucesso, há indícios claros da continuação dos argumentos que irão alinhavar os novos capítulos que merecerão tentativas de colocarem outros protagonistas mais famosos: o ex presidente Lula e a atual presidente Dilma. Vivemos momentos perigosos.

A falta da essência democrática desse nosso oligopólio da comunicação, esse que temos, é, ao final, espantoso, principalmente quando esses anseios particulares encontram eco no principal tribunal jurídico do país. Um júri supremo que julga por inclinação política e não técnica é um risco que não deveríamos correr, sobretudo depois de vencermos uma etapa tão árdua que foram os anos de chumbo pelos quais passamos.
Como disse no primeiro parágrafo , me referindo aos militares, os humores de um tribunal político podem variar e amanhã poderá voltar-se contra quem tanto o bajulou.